Nunca fui fã de Kesha, escutava uma música ou outra no emaranhado pop/eletrônico salvos no Pen Drive do carro, então quando ela lançou Praying não dei a menor bola, mesmo depois de ver o clipe em alta no YouTube por mais de uma semana.
Por insistência da internet, resolvi assistir.
A explosão de cores, a montagem frenética e paralela, a mistura das crenças pagãs com a cristã, o piano de igreja acompanhado da voz angelical e crua da Kesha, pela primeira vez eu ouvia sua voz sem todos aqueles sintetizadores horripilantes, e muito, mas muito simbolismo, me fez botar este clipe no hall de obras de artes da internet.
Um dilema
Que a indústria fonográfica é forte nos Estados Unidos todos nós sabemos, o que não fica muito claro é o quanto, alguns players desta indústria podem ser cruéis uns com os outros.
Kesha foi descoberta por um casa talentos de uma grande gravadora. Bonita, talentosa, carismática, check list perfeito para uma artista pop. Agora é só compor umas músicas chiclet, personal trainer pra manter o corpo em dia, muita grana em mídia… Pronto, temos uma carreira internacional.
Porém, existe um grande dilema na indústria cultural. A lógica da indústria é fabricar aquilo que o consumidor quer ouvir, a lógica de um artista é te dar uns tapa na cara pra largar de ser trouxa. Como o consumidor geralmente não gosta de levar uns tapas na cara, o artista passa fome.
Para sobreviver você tem que ponderar, criar o que o espectador espera que você crie, o feijão com arroz, o Lá, lá, lá Tchê, Tchê, Tchê de sempre e, se pá, de vez em quando, soltar uma musica mais autoral, meio perdido ali no álbum.
Violência contra Kesha
De cara não entendi nada do clipe, óbvio, não acompanhava sua carreira de perto para saber de tudo, então fui pesquisar. A história é a seguinte.
Kesha acusa seu agente, dentre outras coisas, de assédio moral, principalmente a inferiorizando dizendo que sem ele, ela seria nada. (Deve ter algum termo do tipo main inferiorization mas desconheço). Obviamente existem os dois lados da história, mas o fato é que esta relação entre o agente, a gravadora, mídia e artista a deixou em depressão. Isto é citado no começo da música.
Well, you almost had me fooled
Bem, você quase me enganouTold me that I was nothing without you
Me dizendo que era nada sem vocêOh, but after everything you’ve done
Mas, depois de tudo que você fezI can thank you for how strong I have becom
Praying • Kesha
Posso agradecer por quão forte eu me tornei
Concluindo
O filme começa com o velório de Kesha. Quem vela é seu agente e a sua gravadora, de terno, gravata e cabeças de porcos. Junta com a fotografia macabra, ouvimos Kesha se perguntar se está morta ou se é apenas mais um sonho terrível.
Acredito que esteja falando do seu sonho de uma carreira musical!
Somos transportado para o limbo onde Kesha, a deriva em cima de uma jangada destruída, suplica por um sinal de Deus. Aqui Jonas Åkerlund, diretor do clipe, ressalta um detalhe que será importante mais a frente, a tatuagem de baleia no pulso da cantora.
O diretor, então, nos leva para a jornada de Kesha que se rebela contra os porcos, a mídia e corre para sua liberdade, sua independência.
Neste exato momento um passarinho pousa na jangada bem ao lado do seu rosto, um detalhe importante é o passarinho ser colorido na fotografia preto e branco desta cena, é o sinal que ela pediu no começo do clipe, antes de começar a música.
Uma segunda jornada se inicia, desta vez em busca do seu Deus, aqui já não vemos mais os porcos a perseguindo, só o seu trajeto até o alto de uma colina onde se ajoelha e começa a orar.
No limbo, onde tudo era petro e branco, a Jubarti, que antes estava tatuada no seu braço, agora nada ao lado da jangada e Kesha se levanta para caminhar ao seu lado, sobre a água mesmo. O sol nasce e agora tudo ficou colorido.
Então temos um vídeo clipe que conta a trajetória do seu renascimento como artista e também como pessoa, um recomeço do zero, sem rancores sem mágoas. A superação de uma doença trágica como a depressão. É lindo.